Pedro To Rot nasceu em 1912, numa pequena aldeia da ilha de Nova Bretanha, na Papua-Nova Guiné — um arquipélago do Pacífico Sul, do outro lado do mundo. Foi nesse território distante que os Missionários do Sagrado Coração (MSC) chegaram no fim do século XIX, enviados da Europa com a missão de evangelizar comunidades indígenas em regiões até então pouco acessadas pela Igreja. A missão em Papua foi um dos primeiros grandes empreendimentos da Congregação fora da Europa, e lá os missionários encontraram acolhida entre os locais, com quem construíram laços profundos. Foi nesse contexto que nasceu e cresceu Pedro To Rot, filho de uma das primeiras famílias batizadas pelos MSC naquela região.
Filho de um líder local respeitado e de uma mãe profundamente piedosa, Pedro cresceu numa família conhecida por seu compromisso com a fé e com a comunidade. Tornou-se catequista ainda jovem, ajudando a manter viva a fé dos cristãos locais quando os missionários foram expulsos durante a ocupação japonesa na Segunda Guerra Mundial. Defensor firme do matrimônio cristão e da liberdade religiosa, foi preso e envenenado na prisão em 1945 por se recusar a abandonar sua missão. Beatificado por São João Paulo II em 1995, será canonizado no dia 19 de outubro de 2025.
A canonização de Pedro To Rot não é apenas a celebração de sua vida heroica, mas também um gesto profundamente simbólico. No primeiro consistório do pontificado do Papa Leão XIV, foi justamente um leigo, negro, pai de família e catequista quem foi escolhido como primeiro santo oficial ligado à nossa espiritualidade. Isso não é detalhe: é mensagem.
Pedro To Rot não era padre, não era religioso, não vivia em Roma nem era doutor em teologia. Era um homem simples, enraizado na vida cotidiana, esposo fiel, pai amoroso, catequista apaixonado e servidor incansável da missão. Viveu sua fé no concreto da vida, na construção da Igreja local, na transmissão do Evangelho mesmo em tempos de perseguição. O que ele fez? O que muitos dos nossos leigos fazem todos os dias nas paróquias, nos bairros, nas famílias. Mas ele o fez com amor radical, até o fim. Até o martírio.
É profundamente simbólico que, na Família Chevalier, o primeiro canonizado seja um leigo. Isso quebra com um certo clericalismo estrutural que, felizmente, tem sido cada vez mais questionado e superado – inclusive pelo falecido e amado Papa Francisco, que tantas vezes nos alertou sobre esse risco. A santidade não é monopólio do clero. Está nos bancos da igreja, nos catequistas, nos pais e mães de família, nos jovens que servem nas comunidades. Está, como dizia Pedro To Rot, na fidelidade cotidiana ao Evangelho, mesmo quando custa caro.
É por isso que muitos leigos da Família Chevalier ao redor do mundo já o assumem como padroeiro. E é justo que o façam. Pedro To Rot é um espelho da espiritualidade do Coração de Jesus vivida no cotidiano, nos rincões do mundo, onde a vida é dura e a fé é resistência. Ele nos ajuda a compreender que viver com os sentimentos do Coração de Jesus não é um ideal distante, mas algo profundamente encarnado: na defesa da família, na luta pela fidelidade, na resistência à injustiça, no serviço à comunidade, na coragem de quem ama até o fim.
Sua canonização é convite. Convite a revalorizar o lugar dos leigos em nossa espiritualidade. Convite a imaginar uma Igreja menos centrada no clericalismo e mais aberta ao serviço. Uma Igreja onde a santidade floresce no chão da vida, nos caminhos de poeira e dor. Pedro To Rot, o “jovem da missão”, é agora nosso intercessor, nosso irmão no céu. Que ele nos inspire a ser, cada vez mais, uma Igreja com o Coração de Jesus: próxima, compassiva e fiel até o fim.
Pe. Fernando Clemente, MSC
Postulador Geral MSC