Uma antiga crônica de uma de nossas províncias brasileiras, fazia essa mesma pergunta a cada um de seus membros professos. As respostas por assim dizer foram as mais diversas a se pensar, destaco aqui algumas: “Vim para os MSC, por que tinha um campo de futebol, e eu queria jogar bola”; “Vim para os MSC, porque sou de família simples, e no seminário diocesano tinha que pagar um ‘dote’ para entrar, e no seminário MSC era de graça”; “Vim para os MSC, porque meu irmão veio primeiro, e para não ficar em casa sozinho com meus pais, vim para os MSC também”; “Vim para os MSC, porque eles estavam na minha cidade”; “– Vim para os MSC, porque queria um pai e os seminaristas falavam que o formador era um pai”.
Os motivos que nos fizeram chegar até aqui, podem ser parecidos com esses, assim como outros. Mas o importante é que o Senhor usou dessas situações para nos conduzir até aqui! Se analisarmos o chamado de cada um dos Doze, veremos que cada um foi chamado na condição de vida que estava, que aqui prefiro chamar de miséria existencial, que cada um de nós estamos sujeitos.
Destaco dentre os Doze, o apóstolo Mateus, a quem Jesus retira da coletoria de impostos (traidor da pátria e do povo). Podemos até dizer que Jesus “não tem bom gosto para escolher seus seguidores”, mas ele o chama a partir de suas misérias. Nos comentários de São Beda, sobre o evangelho do chamado de Mateus[1]. São Beda diz: “O olhou com misericórdia e o elegeu”[2], que por coincidência é o lema de pontificado do Papa Francisco.
Quando penso nessa frase recordo-me: de onde o Senhor me tirou? onde Ele pousou o seu olhar sobre mim? Fico novamente diante das minhas misérias existenciais que vivia, e como a sua misericórdia, me escolheu, elegeu, e principalmente resgatou, não porque era o melhor, mas porque era o mais miserável.
Ainda sobre a chamada de Mateus, e perceptível ao coração e aos olhos que, ele não se reveste de glória, por ter sido chamado pelo Senhor, “agora eu sou um apóstolo, príncipe da Igreja!”. Assim ele não fica orgulhoso ao ser chamado, porque ele sabia de onde o Senhor o havia chamado.
Ele não esqueceu sua origem. Pois quando esquecemos de onde viemos, corremos o risco de deixar de ser servidores da Vinha do Senhor, para sermos funcionários carreristas, “que trabalha muito bem, mas não é Apóstolo. Será incapaz de transmitir Jesus; será um organizador de planos pastorais, de tantas coisas; mas, no final, um negociante. Um negociante do Reino de Deus, porque esqueceu de onde foi escolhido”[3].
Creio devotamente que essa reflexão, deva perpassar nossas comunidades formativas e até mesmo as comunidades religiosas, pois cada um de nós fomos chamados de um lugar em um momento específico de nossas vidas, “tirados do meio do povo”[4], para ser sinais de Deus na vida do seu povo, mas com as mesmas características do povo de onde o Senhor nos escolheu.
Por isso na caminhada vocacional, o anormal vem se tornou normal, vermos vocacionados que esqueceram de onde vieram, que negam suas origens, e a realidade do seu povo, muitas das vezes simples e sofrida, o reflexo inverso do filho das entranhas daquela terra.
Particularmente, não esqueço em um só dia do povo de onde o Senhor me chamou, por uma característica física e existencial que eu comungo. Olho para os meus pés e vejo a realidade de um povo refletida neles, rachados e grossos, por pisar descalço nas terras fendidas pelo calor do sol e muitas das vezes inférteis do Jequitinhonha. Mas regadas de esperança que é o único fertilizante que faz a vida despontar a cada dia e recomeçar.
São tantas as características que cada um de nós temos, a oferecer ao Reino, provenientes de nossas origens, quando conseguirmos assimilá-las a nossa vocação, seremos capazes o suficiente para responder: De onde o Senhor me chamou? De que miséria existencial ele me tirou? E quais são a características do meu povo, que tenho a oferecer?
Assim saberemos o porquê viemos para os MSC!
Ir. Izaias Oliveira da Silva, mSC